O mês de agosto lembra-me férias em família e com amigos. Os dias longos e a liberdade de ação, sem compromissos profissionais, geram um bem-estar incomparável com outros meses do ano. É um mês de férias por excelência. Apesar do hábito se manter, há décadas atrás algumas famílias passavam dois ou três meses de férias no algarve. Uns em casa própria, outros em casa alugada (normalmente a mesma casa anos e anos a fio) e outros, ainda, permaneciam no hotel em regime tudo incluído. Disfrutavam assim do mar, do sol e da vida mundana que o sul proporcionava. Agendavam jantares e almoços entre amigos e davam longos passeios na marginal, o “passeio das vaidades”, onde exibiam as tendências da moda. Outros, mais recatados e menos dados à exposição pública, ficavam por casa a descansar ou na varanda da casa a refrescar-se e a ver passar os veraneantes ávidos de movida e de vida social.
Havia alegria e convívio constantes. Os dias sem programa lúdico rareavam. Por vezes o programa fazia-se na própria praia, no bar da zona frequentada pela família e grupo de amigos. Aí se reuniam, todos quantos passavam o dia na praia, normalmente à hora do almoço, para mais umas horas de convívio. Às vezes o almoço prolongava-se demasiado e as crianças, já saturadas e ansiosas para mais uns mergulhos, acabavam fazendo tropelias. Ou a bola batia onde não devia, ou o toldo do vizinho era invadido para um joguete qualquer, entre outras peripécias.
No convívio entre amigos, além das petiscadas frequentes, havia tempo para longas tertúlias. As conversas no masculino giravam, por norma, em torno dos temas: desporto, carros, negócios e… mulheres (claro). Estas, mais dadas a fofocas, passavam mais tempo a falar dos filhos e das angústias da vida doméstica do que era suposto em tempo de férias. A criançada entretinha-se no café “da esquina” a jogar matraquilhos, um jogo que atravessou gerações e que ainda hoje desperta interesse. Desse modo, gastava a energia ainda disponível e assegurava uma noite tranquila de sono.
Antes do final das férias, havia sempre um dia dedicado às compras por terras de Espanha. Aiamonte (Ayamonte, como se diz em bom castelhano) era o destino. A travessia do rio Guadiana era feita de ferry a partir de Vila Real de Stº António, o local de embarque. Logo após a travessia o grupo dividia-se. Por norma os homens ficavam com as crianças para deixar as mulheres mais livres para as compras, dado serem normalmente estas as responsáveis pelo setor da economia doméstica de primeira linha: alimentos, produtos de higiene e limpeza, vestuário, etc.
Enquanto os homens se entretinham a procurar marisco fresco nos vários armazéns de revenda, as mulheres percorriam todas as lojas à procura das últimas novidades. No final do dia (ou da tarde, ou da manhã), depois do périplo completo e envoltas numa mistura de aromas florais fortes, carregavam os sacos das compras. Entre os vários produtos não faltavam o típico gel de banho, os cremes de rosto e corpo, os perfumes e as “famosas” alpercatas (de sola compensada), de atar à perna, muito usadas na época. Um dia (ou parte dele) bem passado e que todos os anos se repetia.
Com a livre circulação de pessoas e bens ir às compras a Aiamonte vulgarizou-se. Além disso, muitos dos produtos, antes inacessíveis em Portugal, passaram a constar das prateleiras de qualquer hipermercado, deixando de ser uma “novidade”. É caso para dizer que a globalização alterou hábitos e rotinas. Modos de estar (e de ser) que se alteraram fruto das mutações sociais e económicas. Vivemos outros tempos, outros ritmos. Melhores? Piores? Estas e outras questões levar-nos-iam para outros campos, outras problemáticas...