Angústia. Desolação. Fadiga. Exaustão. Cansaço físico e mental. Um estado de alma incomparável. Sem forças para alterar o rumo das coisas. Eis o retrato do professor atual, o professor dos tempos que correm (velozmente) e que deseja, antes de mais, respeito e um estatuto consentâneo com a sua responsabilidade.
É frequente ouvir dizer: “antigamente é que era bom…“ O que era bom? Era bom ser professor? Era bom ser aluno? Era bom ir à escola?
Já não sou propriamente “jovem” mas também não sou “velha” o suficiente. Sou uma professora com trinta anos de serviço efetivo em prol da educação e, concomitantemente, em prol do desenvolvimento do país. Vivi reformas educativas (várias), executei políticas educativas (diversas), lecionei a centenas de alunos. Com maior ou menor entusiasmo, maior ou menor convicção, maior ou menor ceticismo, executei as tarefas impostas e fiz o melhor que podia (e sabia). Dei o melhor de mim. Com empenho e dedicação abracei a profissão que escolhi por vocação. Aos sete anos, em casa da minha avó, fazia da “tábua de tender o pão” a minha secretária caseira. Sobre a mesma colocava os manuais escolares com os quais ensinava os escassos “alunos” (um ou três, conforme os dias). A pequenada da vizinhança aproveitava, desse modo, para fazer os trabalhos de casa e aprender (nalguns casos) conteúdos mais avançados (que a “professora” já aprendera). Foi assim, desta forma, que o desejo se tornou real. Ainda hoje, apesar de tudo, os momentos em sala de aula, junto dos alunos, constituem momentos únicos e de grande realização pessoal. É por eles que continuo na profissão e dou o meu melhor.
Todavia, reconheça-se, ensinar no século XXI, numa sociedade em plena crise de valores, não se afigura tarefa fácil. Há cada vez mais uma ausência e/ou desuso de um conjunto de valores morais e cívicos norteantes da vida em sociedade, os quais são indicadores da cultura e do modo de estar e ser de um povo. Estamos perante aquilo que alguns designam de “crise de valores” e “ falta de cidadania”. Essa “ausência de regras” é já notória em grande parte dos nossos alunos. Os alunos evidenciam, eles próprios, os sinais dos tempos. Mais irreverentes, mais intolerantes a tudo, menos interessados na aquisição de novos saberes. Muito confinados ao seu mundo. Um mundo virtual e silencioso. Um mundo onde a partilha e o convívio escasseiam e a obediência e o respeito não existem. É difícil moldar personalidades vocacionadas para a rebeldia e para a falta de ambições. Além disso, a família enquanto estrutura de apoio está em processo de desmoronamento. A sociedade vive dias difíceis e os alunos percebem isso e absorvem as angústias subjacentes. Resultado: alunos desinteressados e desmotivados e uma Escola onde todos o profissionais da educação, entre os quais os professores, lutam para contrariar as tendências. Uma luta inglória que conduz ao estado de alma frequente nos dias de hoje: desmotivação geral.
Uma grande maioria dos professores está efetivamente desmotivada com a sua atividade. A indisciplina dos alunos, a falta de incentivos e reconhecimento profissionais, a burocratização do sistema educativo, entre outros, são alguns dos problemas inerentes à classe e que alavancam esse descontentamento generalizado. Não por falta de vocação, como alguns (os menos esclarecidos) teimam em afirmar, mas porque quem legisla desconhece o contexto real da profissão, suas lacunas e constrangimentos. Até quando vamos continuar a "reformar" o sistema educativo esquecendo um dos seus principais intervenientes? Sem professores motivados não há relação pedagógica saudável e não se atinge o objetivo último da educação: formar cidadãos plenos. É suposto os professores serem detentores de um conjunto de valores sociais, morais e éticos capazes de mover consciências e de ajudar a construir e reconstruir a realidade social. No entanto, sem a aceitação social do professor, como agente fundamental do crescimento e desenvolvimento das sociedades, a tarefa é árdua e muitas vezes não resulta. É esse desalento decorrente da tarefa de educar que conduz, muitas vezes, ao abismo emocional e, não raras vezes, ao desgaste físico. Perguntam-me: e qual a solução? Não há soluções mágicas e imediatas, mas há o acordar de consciências para ajudar a alterar políticas lesivas dos direitos de quem tem por missão a educação.
Maria Sebastião