(Sou) um cálice
Sou um grão de areia: um sobrevivente, das marés do oceano onde mergulhei. Resistente e calibrado pelas mãos do Homem e do tempo. Um subserviente que a vida testou. Já bebi do melhor néctar, já vivi o maior dos prazeres. Hoje, neste lado mais sombrio da minha existência, aguardo, resiliente, pelo inverno da vida. E porque já vivi no paraíso, guardo em mim as melhores recordações de quantos comigo privaram. Foram reis, foram plebeus, foram anjos e demónios. Foram todos aqueles que me tomaram nas mãos e cujos lábios beijei. Guardo em mim um pouco de todos numa mistura agridoce, que me alimenta a alma.
Nota : o texto que escrevi quando a formadora J. S., do workshop de Escrita Criativa, pediu aos formandos que escrevessem um texto: "imagine-se um objeto e conta a vida desse objeto" - um copo/taça exposto(a)
na Torre de Menagem do castelo de Mértola.